A médica Cláudia Pini ficou intrigada com quatro cães da raça rottweiler que faziam a segurança de um prédio na avenida Farrapos, em Porto Alegre. Ela passou a observar os dois casais de cães e verificou que eles estavam sem água e comida havia mais de 15 dias. Após várias denúncias aos órgãos cabíveis, ela procurou ajuda via rede social. Cerca de 48 horas depois, a mobilização no Facebook fez com que a Polícia Civil chamasse o proprietário da Cia do Cão e responsável pelos animais para depor. José Reinaldo de Jesus será autuado nos próximos dias.
A Lei nº 14.229/2013, sancionada pelo governador Tarso Genro no dia 16 de abril, proíbe a prestação de serviços de vigilância de cães de guarda com fins lucrativos no Estado. Conforme a legislação, a partir dessa data, as empresas que oferecem o serviço têm um ano para extinguir os contratos e 60 dias para realizar um cadastro que visa à integridade física dos animais. Isso significa que até junho essas empresas devem apresentar condições de albergagem dignas, cópias do Certificado de Regularidade e de Responsabilidade Técnica registrados no Conselho Regional de Medicina Veterinária do Rio Grande do Sul (CRMV-RS) e relação dos cães, acompanhada de documentação e carteira de vacinação rubricada por um veterinário. Além disso, todos os animais devem ser esterilizados e microchipados.
A Secretaria Especial dos Direitos dos Animais (Seda) informou que a Cia do Cão será autuada e, caso não cumpra as regras, o caso será encaminhado ao Ministério Público. Para Jesus, a pressão por parte da Seda é desonesta. “Isso é jogo baixo. A Seda está atacando meus clientes e adiantando o processo. Eu vou ter que mudar de atividade com essa lei, só que ninguém diz para quem devo entregar os cães”, alega.
Apesar de toda a mobilização pelo Facebook, o resultado não foi o esperado pelos apoiadores da causa, pois Jesus recolheu os bichos após prestar depoimento e não permitiu a adoção. Nesta terça, os fiscais da Seda estiveram no canil da Cia do Cão, na Restinga, com uma notificação para que os animais sejam microchipados. Jesus explicou que se negou a assinar o documento porque precisa consultar um advogado.
O governo estadual vetou parcialmente os artigos que tratam das penalidades e do valor das multas a serem aplicadas em caso de descumprimento. A norma estipula ainda que, nesse período, nenhum animal poderá ser abandonado, sujeito a agressão física ou eutanásia. Em caso de morte, o animal será submetido a uma necropsia.
Defensores da causa temem possível eutanásia
“Nosso medo é em relação ao que vai acontecer com os cachorros agora. Tememos a eutanásia. Conseguimos pessoas para adotar os cães, e ele (Jesus) se recusa a doá-los”, lamenta Cláudia. Na página do Facebook Contra Aluguel de Cães em Porto Alegre, há fotos e relatos sobre o estado dos animais - uma das fêmeas estaria com a pata quebrada e a outra com infecção ocular.
A revolta aumentou quando, após prestar depoimento na delegacia, Jesus foi até onde estavam os cães e levou-os para o canil da empresa. A Brigada Ambiental acompanhou o processo e declarou que não havia nenhum animal maltratado. Vizinhos e comentários na rede social garantem que a empresa esteve no prédio na segunda-feira e trocou alguns dos cachorros.
Jesus nega a troca dos animais. Em seu depoimento, ele declarou que os cães recebiam água e comida diariamente. Os representantes da Brigada Militar e da Polícia Civil entenderam que a denúncia era improcedente porque não havia características de maus-tratos.
No relatório da Seda, consta que havia cinco animais que não estavam presos, mas soltos no interior do prédio e com alimentação e água disponíveis. “Não havia água para eles até então. Temos fotos dos cães tomando água em garrafas que disponibilizávamos pelas grades. Eles maquiaram o lugar”, denuncia Cláudia.
O presidente do CRMV, Rodrigo Lorenzoni, afirma que a Cia do Cão possui registro no conselho e tem responsável técnico. “Se ficar comprovado que houve maus-tratos, o CRMV tem obrigação de cobrar do veterinário da Cia do Cão”, adverte. Em relação à microchipagem, ele explica que o profissional não pode obrigar o empresário a fazer o procedimento nos animais.